Dia Mundial da Filosofia
No passado mês de novembro, os alunos de Filosofia de 10° e 11° ano foram desafiados a escolher um objeto do seu quotidiano, como símbolo do ‘filosofar’, e a argumentar em favor da sua escolha. O produto deste trabalho esteve reunido na exposição patente na Biblioteca da Escola Dr. Manuel Laranjeira que assinalou, de forma muito particular, o Dia Mundial da Filosofia, que ocorre anualmente na terceira quinta-feira do mês de novembro, de acordo com o instituído pela UNESCO.
Celebrou-se a atitude filosófica perante o mundo que nos rodeia e a dedicação investida pelos alunos nos trabalhos desenvolvidos gerou múltiplas imagens de rostos refletidos no vidro da Biblioteca: os de todos quantos tiveram a curiosidade de embarcar neste desafio de olhar o mundo à nossa volta, numa perspetiva diferente.
A Filosofia faz sentido se nos surgir como ponto de partida para a reflexão e a realização desta exposição acabou por gerar um interessante debate acerca da própria possibilidade da sua concretização. Recordando com I. Kant que “o símbolo de uma ideia (ou de um conceito da razão) é uma representação do objeto segundo a analogia”, as professoras de Filosofia conceberam a escolha de um objeto capaz de simbolizar uma dimensão divergente da material, porquanto o procedimento analógico constitui o núcleo metodológico da simbolização. Segundo E. Cassirer, o ser humano, pela sua capacidade simbolizante, distingue-se dos demais animais, porque edifica um mundo próprio a partir da criação de símbolos, a principal atividade humana, não podendo viver sem os expressar. O homem é um animal simbólico, que constrói a sua existência pelas conjugações do “sensível” e do “intelectual”, expressas nas manifestações culturais, para atingir, por meio delas, a sua tão almejada liberdade.
Foi desta forma que se posicionaram os alunos, quando selecionaram, por exemplo, uma lanterna como símbolo da Filosofia, pois “simboliza a luz e, como tal, um objeto que traduz a criatividade ou ideia – partiram do mito da caverna, de Platão, onde é necessário sair da caverna, da sombra para chegar à luz, para conseguir ver e entender o mundo (Francisco Alves, 11ºC); ou quando selecionaram um espelho, já que “tal como este reflete uma imagem, a Filosofia faz-nos voltar sobre nós próprios e levantarmos questões” (Isis Gonçalves, 11ºC).
Contudo, é, sem dúvida, na atitude dialógica do confronto sustentado de modos de ver e pensar que a Filosofia se sedimenta, que o conhecimento humano avança e que a Humanidade evolui. Há, então, que dar voz à justificação de não realizar a tarefa, porque avançar pode ser tão legítimo como suspender a ação. E porque a Filosofia é, como este jornal, PLURAL, partilhamos esta reflexão crítica do aluno Eric Serra, 11ºC:
«Não é sobre “o quê?” … mas sobre “por quê?”. A Filosofia, tal como Pitágoras explicou ao criar o termo, não se traduz numa atividade indiferente às demais: o filósofo não é aquele que vai a uma arena assistir aos jogos, nem aquele que lá compete, mas quem observa o jogo, não por qualquer gosto ou interesse, mas apenas para refletir sobre tal. Diferentemente daquele filósofo que surgiu com a palavra que reflete a ação humana marcada pelo uso único e ilimitado da característica mais fantástica que um ser pode deter – a Razão –, nenhum indivíduo que a possua consegue sintetizá-la num só objeto. Senão, como representar o imaterial através do material, o metafísico através do físico, a reflexão através da práxis? Ou como reduzir o infinito a um número, o todo a uma parte, o geral ao específico? Portanto, se a atividade filosófica resulta, exclusivamente, do ato de pensar (não físico), e se não escapa a uma dimensão abstrata, como poderei eu demonstrá-la, retratá-la numa corporeidade, algo que se lhe opõe em termos existenciais, por ser palpável, tátil, concreto? Qualquer objeto não seria capaz de retratar a Filosofia na sua essência e pureza, mas apenas uma imaginação pessoal e subjetiva que os relacionam por meio de um conceito (o espelho/a água que reflete, a lâmpada que clareia etc). Se há alguma coisa que possa representar a Filosofia em seu estado puro e original, ela só pode ser abstrata e restrita a uma dimensão imaterial – a própria ação de pensar/refletir/discutir –; ou, no caso de a demonstrar sem que seja pura e essencialmente, conter-se-á em palavras (pensamento, reflexão, questionamento, discussão etc). Mas, jamais, poderá estar a atividade filosófica traduzida num material. Tanto que a Filosofia não se sente, não se toca, mas pratica-se, realiza-se. Por fim, bastará salientar uma última coisa, que se debruça justamente na primeira frase deste texto: questionar-se e refletir sobre a questão que surgiu terá tido mais valor e relevância do que simplesmente apresentar uma conclusão material, posto que a própria Filosofia tem como pilares fundamentais o questionamento e a discussão, tendo ocorrido, de facto, neste caso. As respostas são somente produtos seus. E, assim, tanto se reforça a incompatibilidade entre a ação reflexiva, marca da atividade filosófica, e seu retrato no material, quanto prova que o ato de pensar, por exemplo, melhor remete à Filosofia.»
Corolário da expressão do pensamento, a exposição contou ainda com a interessante participação dos alunos de Artes Visuais, das turmas 10ºE e 11ºD1, que produziram retratos de Filósofos com cujo pensamento mais se identificaram.